quinta-feira, 27 de maio de 2010

Na marra, com dor, com sangue

- Aff...
- Quando você suspira assim, Ana...
- O que que tem?
- Me desanima também...
- Celso, às vezes eu acho não tem mais jeito...
- É...
- Eu já tentei, você já tentou.
- Cansa, sabia?
- Eu sei... também to cansada...
- Eu não quero acreditar que foi perda de tempo.
- Mas no final das contas, essa sempre é a minha conclusão.
- (*buff*)
- E o pior é que nem sei quando começou.
- Eu chuto que foi quando a gente se casou. Saiu do controle.
- Você reparou?
- Aham.
- Em mim ou em você?
- Ah... mais em você.
- Poxa, sério?
- É. Mas é porque a gente custa aceitar o que o problema também é nosso, né?
- E você não falou nada?!
- Não queria te magoar. E talvez você falasse o mesmo, também ia me magoar.
- Ficou muito na cara?
- Não... na cara não.
- Ai, ai, Celso Henrique, Celso Henrique. A que ponto chegamos? Estamos no limite!
- Mas não acho certo a gente resolver na marra, com dor, com sangue...
- É, nem eu. Tem que ser de uma maneira racional.
- Concorda comigo que não podemos desistir dessa dieta?
- Uhum. E nem podemos sair da academia. É a única maneira inteligente de a gente perder peso.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Lupa

- Bora, Ana!
- Já vou!
- Mas você demora muito pra se arrumar!
- É que perdi meu negocinho!
- Que negócio?
- Aquele negocinho, de colocar assim...
- Ã? Assim como?
- Coloca naquele trocinho. Pra apertar, pra não cair.
- Não to entendendo nada.
- Ai, Jesus, como chama?!
- Jesus?
- Não, o... o... o trem que coloca pra não deixar cair!
- Trem? Ã?!
- Ai, Celso! Você também não quer entender!
- Claro que quero, to te esperando há horas! Você já se maquiou, você já mudou mil vezes de roupa...
- Epa! Troquei de roupa porque o zíper da bermuda explodiu por sua causa!
- Tá, tá, tá...
- E se você quisesse ir logo, já teria me ajudado a procurar!
- Mas procurar o quê?!
- O... o...breguete!
- O que na face da Terra é um breguete?!
- Breguete é jeito de falar!
- Jeito de falar o quê?! (*suspiro*) Ana, minha flor, meu arco-íris em dia de verão, me ajuda a te ajudar: esquece esse dialeto e explica.
- Tava colocando o trocinho quando o negocinho caiu. Pode estar dentro da minha roupa, não sei... Por isso que to demorando. Ou ta no chão, ou ta na roupa, ou bateu na roupa e pra fora do banheiro, caiu na pia, não sei! Entendeu ou quer legenda?
- Hummmm. Caiu um botão?
- Não, caiu o ... a...
- O negocinho da orelha!
- Isso!
- Seu brinco?
- Nãaao, o que aperta, pra não deixar cair!
- Ahhhh, a tarracha!
- Isso!
- Que cor que é?
- Acho que é transparente...
- Pô, Ana, nesse piso branco... difícil...
- Pois é... já passei o pé pra ver se encontro... daqui não vejo nada.
- Peraí, que vou pegar aquele negócio pra ver melhor.
- Que negócio?
- Onde é que fica... o... a?
- Do que você ta falando, Celso?
- Daquele... que ajuda a ver...
- Não to entendendo...
- É uma haste, redondo em cima!
- Ã?

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Dia das mães

- Ai, ai... Dia das Mães, eu longe da minha, você longe da sua... somos maus.
- Ah, amor, pensa no lado positivo: estamos longe das nossas respectivas sogras...
- Bobinho... fico vendo estes comerciais do Dia das Mães... me dá uma vontade...
- De se reproduzir?
- É...
- A gente pode começar a treinar agora, se você quiser. Mas só treinar, pra um dia chegar à perfeição.
- Celso, é serio! Eu tenho espírito maternal. E a gente ta casado há dois anos... tá na hora de encomendar!
- Tá nada, ele vai vir na hora certa. A gente ainda ta em semi lua-de-mel!
- Ah, amor, idealiza: nós dois abrindo o resultado do exame. Que máaaaximo!
- Idealizei. Minha pressão baixou.
- Ah, pára! Você vai amar, vai ficar todo bobo... vai curtir cada momento da minha gravidez!
- Vou sim! Ah, vai ser lindo. Você engordando e engordando meses a fio...
- Aham!
- Ficando com aquele barrigão!
- É!
- Inchada... porque você sabe, né? A gestação traz consigo problemas de circulação.
- É, tem isso...
- Usando aqueles macacões de grávida... andando como tivesse acabado descer de um cavalo...
- Será?
- Vou te dar maior força quando você tiver que evitar as comidas que você mais gosta... juro que vou te segurar quando você enjoar e vomitar pelos cantos...
- Hum....
- E nas festas, você super barriguda, brindando com água... coisa linda... momento sublime...
- Ih, é...
- Mas vou curtir mesmo, vou ser um supercompanheirão quando te levar ao médico!
- Pra ver o ultrassom?! É a parte mais empolgante!
- Não, vou te levar no urologista... Grávidas costumam ter incontinência urinária. Sem falar nos gases...
- Acho que prefiro passar o domingo com minha sogra a ouvir meu marido sem vergonha.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Ursa Maior

- Alô?
- Oi, linda... que e-mail é este que você me enviou? “Tempo para reflexão acerca das relações construídas nos últimos anos. Dia propício para compras vultosas e assinatura de contratos. Anime-se: há um sol que brilha para todos”? Não entendi nada!
- É seu horóscopo de hoje.
- Meu? Tipo “horóscopo de Celso Henrique de Matos Caludo”?
- Ai, ai, Celso... é pros sagitarianos.
- Ana, você realmente acredita que todos os sagitarianos do mundo vão ter um dia parecido? Todos os sagitarianos vão ficar refletindo sobre os relacionamentos dos últimos anos, depois vão assinar contratos e depois vão olhar pro sol?!
- Olha, eu mandei o horóscopo pra você. Se não quiser acreditar, não acredita!
- Vou reformular: você acha que o mundo se divide em 12 tipos de pessoas? Um mundo com o quê?... 6 bilhões de pessoas... que podem ser separadas em 12 tipos?
- Não, não acredito.
- Então!
- As pessoas têm ascendente, Celso.
- Ok, vamos lá: 12 signos combinados com 12 signos... 144 tipos de pessoas?
- Peraí... quatro, vai um, noves fora... isso, 144.
- Ok, então no nosso bairro, por exemplo, que deve ter mais que o triplo, que o quíntuplo de 144... tem sempre alguém que vai ter um dia parecido com o do vizinho?
- Ai, Celso, não é isso! O horóscopo é como um guia, um conselheiro, um grilo falante, um big fone, entendeu?
- Eu não acredito nessas previsões! O estagiário da redação deste jornal, ou site, sei-lá-o-quê, com certeza se diverte colocando pra funcionar a máquina de previsões aleatórias. E pode ter certeza de que, amanhã, vai ter um outro signo com a mesma previsão que esta daí...
- Acho que você podia dar uma chance aos astros, Celso. Eles olham por você, ‘tão em lá cima, onde você não alcança. Humildade.
- Ok, vamos lá. Vou meditar um segundo sobre estas minhas “relações construídas nos últimos anos”. O que será que quer dizer, ó Ursa Maior?
- ...
- Ursa Maior?
- Quer dizer que você vai passar o dia pensando em mim! E Ursa é a sua avó.
- Ok, ok... compras vultosas e contratos?
- Você vai pensar tanto em mim que vai resolver me dar uma jóia. Ou... ou... ouço sinos, ouço sinos?!
- Oi?
- Contratos importantes, Celso! É o céu falando pra gente casar!
- Sabia que isso tinha um significado do jeitinho que você queria!
- Esse sol, né, brilha para todos... A gente tem que casar de manhã!

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Ih, acabou a luz!

- Ih, acabou a luz!
- Ah, que droga! Também, com essa chuva lá fora...
- Ventando pra caramba...
- Ai, que saco, não tem nada pra fazer!
- Como não, Ana?
- Amor, com chuva, a gente fica preso dentro de casa, e no escuro, não tem como fazer nada...
- Ahhh, mas tem sim...
- Tem nada! Pra tudo a gente depende de energia.
- Aí é que você se engana! Tem uma ooooutra energia que a gente pode usar...
- Ã?
- Pensa, Ana, pensa... energiiiia...
- Ai, solar é que não é...
- Muito bem, aluna! Com chuva, energia solar é que não rola mesmo.
- Aquela do vento... como é que chama mesmo... Eólica?
- Só se você quiser fazer um catavento. E algo me diz que você não quer, e se você quiser, eu vou te impedir.
- Ai, dá uma dica, Celso, antes que a gente morra de tédio!
- A dica é: energia que vem dos músculos...
- Hummm, energia muscular?!
- Eu devo ter jogado pedra na cruz! Energia física, dona Ana-banana!
- Ahhh, táaaaa!
- O que a gente pode fazer usando nossa energia física no escuro, dentro de casa?
- Ai, Celso! Please, né? Você tem que ser muito boca-aberta pra querer fazer ioga com essa tempestade lá fora!
- E quem falou em fazer ioga?!
- Ué, no escuro, energia física... que difícil essa!
- Ana, pensa, meu bem, pensa, por favor: escuro, dentro de casa, só nós dois...
- Ai, tem outra dica?
- Deixa eu ver... ó: pra iluminar, a gente pode usar velas!
- Ahhhhhhhhhh, Celso! Bobinho...
- Que tal, hein hein hein?
- Só você mesmo!
- Ah, vai, lindinha (*smack* *smack* *smack*)... o tempo passa rapidinho!
- Ah, eu não!
- Por que não?! Qual o problema?!
- Celso, por favor, né? Jogar xadrez é coisa de nerd!
- Ã?!

segunda-feira, 29 de março de 2010

Na garagem

- Tá confortável?
- Hum, to.
- Certeza?
- To, Celso...
- Ok, então, vamos lá. Pode pegar.
- ...
- Muito bem...
- Tá bom assim?
- Não precisa ser forte, nem fraco, viu?
- Ai, ai.
- Tem que ter segurança no que tá fazendo, entendeu?
- Entendi, Celso! Você fala como se eu nunca tivesse feito isso antes.
- Mas faça como se fosse a primeira vez... passa a mão, sente...
- ...
- E aí?
- Ah, normal!
- Normal?!
- Sinceramente? Igual a todos.
- É completamente diferente! Ele é todo... cuidado... bem acabado...
- Você fala assim porque é seu, aí você acha ele é tuuuudo do melhor!
- Se você tivesse um, acharia a mesma coisa do seu!
- Talvez, talvez, mas... vamos lá...
- Lembre-se: isso é um instrumento de poder.
- Ai, meu Deus, Celso, pára de teoria e vamos pra prática!
- Calma, apressada! Tem que curtir o momento! Existe todo um prazer nisso!
- Eu não to achando graça nenhuma até agora. Podemos continuar?
- Espera...
- Vou tirar ele daqui...
- Não, espera! Antes de colocar ele pra fora, tem que sentir o movimento...
- Você tá falando como se estivesse chapado...
- Como você é impaciente!
- To ficando entediada! A gente mal começou e você não pára de falar do meu ouvido! Você sabe que eu não gosto que você fale o tempo todo nessas horas!
- Por que não?
- Nenhuma mulher gosta de homem que fica tagarelando!
- Ana, eu só quero que tudo ocorra bem. Então, vamos devagar...
- Devagar?! Isso tá inerte! Celso, você me disse que ia me deixar dirigir seu carro! Em 10 minutos, tudo o que fiz foi colocar a mão no volante!

sexta-feira, 26 de março de 2010

Ponto de partida

- Oi.
- Humpf.
- Tudo bem, gata?
- É comigo?
- Claro, você é a única gata por aqui.
- Sério isso?
- Sério, te achei a mais bonita daqui.
- Não, não, você não ta me entendendo: é sério que esta é a sua melhor cantada?
- Bem, não é cantada, dessas que a gente chama de ‘cantada’, afinal, não ia te dizer coisas que todo mundo diz...
- Pára!
- Pára o quê?
- Dá meia volta e começa tudo de novo, porque essa abordagem, não sei não, ta capenga.
- Oi?
- Vai, vamos de novo, eu tava dançando aqui e você chegou.
- Bem... err... oi.
- Oi.
- Você vem sempre aqui?
- Meu querido, isso aqui é uma boate, só abre de noite e no final de semana, então... 'sempre' não é a palavra.
- Hummmm.
- Vai, de novo, ta ruim demais!
- Mas...
- Anda!
- Ta... to meio confuso, mas ... oi.
- Oi.
- Tudo bem?
- É, ta tudo bem.
- Ta ocupada?
- Hum, to dançando.
- Ta sozinha?
- Alô, to com minhas amigas!
- Eu digo sozinha, sem ninguém, sem dar uns beijos na boca, na seca.
- O que te faz pensar que eu to na seca? Eu tenho cara de pega-ning?
- Não, não é bem isso que eu quis dizer...
- Poxa, esperava mais de você.
- Como assim?
- Você ficou me olhando um tempão! Esperava que você fosse, sei lá... mais...
- Mais...?
- Ah, quer saber? Deixa. Isso de você ter umas cantadinhas sem graça... murchei.
- Poxa, eu tentei ser sincero!
- Hoje não rolou. Quem sabe outro dia.
- Logo hoje que uma cigana disse que eu ia encontrar a mulher da minha vida...
- Jura?!!
- Aham, ela foi tão convincente... caí como um bobo, essas coisas de a gente acreditar em esoterismo...
- Mas era cigana de verdade, ou era louca varrida dessas que anunciam que o mundo vai acabar?
- Cigana de verdade.
- Tem certeza?
- Tinha até dente prateado.
- Gente! Onde foi isso?
- Tava na rua, ela me olhou nos olhos, pegou em minhas mãos, apertou bem forte...
- E aí?!
- E aí ela revirou os olhos e ela passou o dedo na minha palma...
- Sei! Ela tava lendo a linha da vida! E aí?!
- Achei difícil ela estar lendo, afinal os olhos estavam revirados... mas enfim, ela falou que era hoje - tinha que ser hoje- que ia achar a mulher que me completaria.
- Que coisa cósmica!
- Falou que tinha cabelos escuros, lisos...
- Nossa!
- Pois é, disse até que a mulher da minha vida se chamaria...
- ...
- ...
- Ana? Ela disse Ana?
- Ana! Isso mesmo! Você se chama Ana?
- Chamo!
- Caramba! Ana, prazer, Celso Henrique. Vamos para um lugar menos barulhento pra gente conversar melhor?